Motoristas de aplicativo caíram no “conto do vigário”, diz cientista político
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Foto: Freepik

Motoristas de aplicativo caíram no “conto do vigário”, diz cientista político

Afirmação foi feita em livro lançado pelo cientista político Leonardo Sakamoto escrito em parceria com o jornalista Carlos Juliano Barros. Para os autores, esses profissionais foram convencidos por um discurso que mascara relações de exploração

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A rotina exaustiva enfrentada por motoristas de aplicativo e outras categorias vinculadas a plataformas digitais está distante da narrativa de que seriam “donos do próprio negócio”. Essa é uma das conclusões apresentadas pelo cientista político Leonardo Sakamoto no livro O que os coaches não te contam sobre o futuro do trabalho (Editora Alameda, 243 páginas), escrito em parceria com o jornalista Carlos Juliano Barros. Para os autores, esses profissionais foram convencidos por um discurso que mascara relações de exploração.

“Eles caíram no conto do vigário de que são empreendedores”, afirmou Sakamoto em entrevista à Agência Brasil.

O livro foi lançado na última semana em São Paulo e Brasília e teve nova apresentação na terça-feira (25), no auditório da Reitoria da UFMG. A próxima atividade será uma sessão de autógrafos no dia 8 de dezembro, no Jardim Botânico, no Rio de Janeiro.

Disparidade nos ganhos

Sakamoto observa que as plataformas retêm a maior parte da receita gerada, deixando motoristas e entregadores com remuneração inferior ao que reivindicam. Além disso, a ausência de direitos trabalhistas impede contribuições previdenciárias e proteção em caso de acidentes ou problemas de saúde.

Segundo os autores, parte desses trabalhadores passou a atribuir seus problemas à CLT, como se a legislação fosse responsável por reduzir oportunidades. Para Sakamoto, no entanto, a raiz das dificuldades está em outro lugar:

“A responsabilidade pelo salário baixo é do empregador. Já a carga de trabalho excessiva decorre de decisões do Congresso Nacional.”

Desmonte de direitos

O pesquisador sustenta que, nos últimos anos, houve um processo organizado de desgaste das normas de proteção ao trabalhador. Apesar disso, influenciadores e lideranças políticas teriam direcionado a crítica à CLT, mesmo quando as violações resultam de práticas patronais.

A obra reúne reflexões recentes dos autores publicadas nos portais Repórter Brasil e UOL, analisando formas variadas de exploração que persistem mesmo diante das transformações tecnológicas.

Entre os mecanismos citados estão a contratação via pessoa jurídica — as conhecidas “pejotizações” — e relações informais que, na prática, exigem obrigações equivalentes às de um contrato formal, mas sem fornecer direitos, como no caso de frilas fixos.

Sakamoto também lembra que práticas arcaicas não desapareceram. Trabalho escravo contemporâneo e uso de mão de obra infantil ainda ocorrem, inclusive dentro de cadeias produtivas de grandes grupos econômicos.

“Avançamos, mas não o bastante para erradicar a escravidão moderna no país”, alerta.

Tecnologia e mobilização

Embora a tecnologia possa ampliar a precarização, Sakamoto destaca que ela também pode fortalecer a organização coletiva. Entre motoristas e entregadores, por exemplo, mobilizações nas redes sociais têm ganhado espaço após o enfraquecimento dos sindicatos com a reforma trabalhista de 2017.

Nesse contexto, as pautas principais dessas categorias incluem um valor mínimo para corridas e condições de trabalho consideradas dignas pelos profissionais.

Tensões no campo do trabalho

O pesquisador aponta que o Brasil oscila entre avanços institucionais — como a atuação da Justiça do Trabalho e do Ministério Público do Trabalho (MPT) — e a persistência de visões que naturalizam a exploração. Como exemplo, cita a resistência enfrentada pela PEC das Domésticas, que ampliou direitos a um grupo majoritariamente composto por mulheres negras e, ainda assim, foi alvo de críticas de setores da elite.

Para Sakamoto, o debate atual sobre o futuro do trabalho passa necessariamente pela defesa da dignidade profissional e pela compreensão de que proteção social não é incompatível com desenvolvimento econômico.

*Agência Brasil

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