A “onda de generosidade” que varreu nesta terça-feira (16) o meio empresarial e as rodas abastadas da sociedade francesa já coletou mais de 800 milhões de euros (R$ 3,5 bilhões) para o esforço de reconstrução da catedral Notre-Dame, segundo as contas do jornal Figaro. As informações são do jornal Folha de S.Paulo.
O altruísmo, porém, trai intentos menos nobres: pela lei do mecenato na França, a firma que faz doações para instituições artísticas pode descontar de seu imposto de renda o equivalente a 60% do valor do patrocínio. Além disso, existe a possibilidade de escalonar o benefício por um intervalo de cinco anos.
Em alguns casos, quando a verba é direcionada a logradouros classificados como tesouros nacionais, a pechincha pode chegar a 90% da quantia repassada.
Mas o Ministério da Cultura, buscando se vacinar contra o oportunismo, lembrou na terça que a etiqueta só se aplica a bens que corram o risco de deixar a França.
O Tesouro perde por ano cerca de 900 milhões de euros (R$ 3,9 bilhões) com o brinde às empresas e pessoas físicas (desconto de 66%) que decidem se aventurar no mecenato, e o buraco só faz crescer: o patrocínio corporativo se multiplicou por dez nos últimos 15 anos, segundo o jornal Le Monde.
Por isso, vozes já começaram a se erguer para pedir a revisão do dispositivo. “É o poder público que vai arcar com a maior parte dos custos da reconstrução”, criticou o deputado do partido Republicanos (oposição) Gilles Carrez. “Isso pode gerar um problema orçamentário para 2020.”
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Alheias às agruras das contas públicas, algumas das maiores fortunas francesas protagonizaram uma batalha surda, desde o lançamento da campanha de arrecadação de fundos para as obras na igreja, pelo título de signatário do cheque com mais dígitos.
Assim, pouco depois de a família Pinault, do grupo de moda e acessórios Kering (que tem sob seu guarda-chuva marcas como Gucci e Saint Laurent), anunciar uma doação de 100 milhões de euros aos trabalhos (R$ 440 milhões), o bilionário Bernard Arnault, homem mais rico do país, fez saber que ele e seu grupo LVMH (megaconglomerado de luxo, com grifes como Louis Vuitton e Givenchy) mandariam 200 milhões (R$ 880 milhões).
A mesma cifra foi reservada no borderô dos Bettencourt, da fábrica de cosméticos L’Oréal). Já a petroleira Total doará a metade.
Dez milhões de euros foram os valores prometidos pelo empresário Marc Ladreit de Lacharrière, que atua no mercado financeiro, e pelo clã Bouygues, com negócios em construção e telecomunicações.
Do exterior também chegaram contribuições. O CEO da Apple, Tim Cook, anunciou em uma rede social que a empresa de Cupertino colaboraria com os esforços para reerguer Notre-Dame, mas não precisou um montante. A Apple tem US$ 245 bilhões (R$ 956 milhões) em caixa.
Já a bilionária brasileira Lily Safra fez uma “doação significativa”, segundo afirmou à agência AFP Stéphane Bern, encarregado do órgão de patrimônio, também sem dar detalhes.
Em Nova York, a associação French Heritage Society pediu doações a seus 450 membros.
E até um rei da Costa do Marfim se prontificou a ajudar –séculos depois de um príncipe local ter sido batizado na catedral parisiense, segundo reza a lenda.
Pelo lado do poder público, a prefeita de Paris, Anne Hidalgo, disse que destinaria um borderô de 50 milhões de euros para a rubrica e propôs a realização de uma conferência internacional na capital para coordenar as doações.
O governo da região de Île-de-France, que inclui Paris e arredores, prometeu 10 milhões de euros.
Por fim, a Unesco, braço das Nações Unidas para a cultura, se comprometeu a tomar parte no esforço de reconstrução do edifício, inscrita desde 1991 na lista de patrimônios da humanidade mantida pela instituição.
“Já estamos em contato com especialistas e preparados para enviar uma missão urgente para avaliar os danos, salvar o que pode ser salvo e começar a tomar medidas para o curto e médio prazo”, disse Audrey Azoulay, secretária-geral da agência. (O Sul)



