O Ministério Público do Rio Grande do Sul (MPRS) formalizou uma denúncia por feminicídio contra um homem de 21 anos acusado de matar o próprio irmão, um homem trans de 29 anos, com 40 golpes de faca, em um crime ocorrido na madrugada de 19 de julho, na zona rural de Ibiaçá, no Norte do Estado. A vítima foi atacada dentro de casa, na frente da própria mãe, em um cenário descrito como de extrema crueldade.
Embora o caso tenha sido inicialmente registrado como homicídio, o MPRS optou por enquadrá-lo como feminicídio, considerando a condição da vítima como pessoa designada do sexo feminino ao nascer. O promotor Miguel Germano Podanosche explicou que, mesmo sendo um homem trans, a vítima ainda se enquadra na vulnerabilidade protegida pela Lei do Feminicídio, uma vez que o texto legal se refere à condição de sexo feminino, e não necessariamente à identidade de gênero.
“A denúncia busca afirmar essa proteção também às pessoas trans que nasceram designadas como do sexo feminino, mas enfrentam vulnerabilidades ampliadas em razão dessa condição”, destacou o promotor.
De acordo com o inquérito, o crime foi motivado por dois fatores: uma discussão aparentemente banal — quando a vítima pediu ao irmão que não fizesse barulho para não atrapalhar o sono da mãe — e uma motivação mais profunda, de rejeição à identidade de gênero da vítima. A denúncia cita um histórico de conflitos familiares, tentativas de suicídio, institucionalizações e episódios de abuso e rejeição, o que reforçaria o caráter estrutural da violência.
O promotor considera que o caso pode abrir um precedente inédito no país quanto à aplicação da lei do feminicídio em crimes contra pessoas trans. A denúncia também inclui o crime de violência psicológica contra a mãe, com base no artigo 147-B do Código Penal, já que ela presenciou toda a ação e sofreu abalo emocional grave.
O acusado está preso preventivamente desde 22 de julho. Se condenado por todos os crimes apontados, poderá cumprir até 55 anos de prisão.