Neste último sábado, a internet foi tomada pela notícia da prisão de Thiago Schutz, o influenciador conhecido como “Calvo do Campari”. Famoso por pregar um discurso de suposta racionalidade masculina e controle emocional, Schutz foi preso em flagrante por violência doméstica após agredir a namorada. O motivo? Ela recusou ter relações sexuais.
Para o público leigo, parece uma contradição: como alguém que vende a ideia de estoicismo e frieza perde o controle de maneira tão brutal? Para a psicologia e a neurociência, no entanto, o caminho entre o narcisismo ferido e a agressão física é curto e previsível.
Vamos entender o que acontece na mente de um agressor quando ele ouve um “não”.
1. A Rejeição Como Ameaça ao Ego
O primeiro ponto para compreender a mentalidade do agressor é entender como ele processa a rejeição. De acordo com o boletim de ocorrência, a violência começou quando a parceira negou sexo.
Para uma mente saudável, isso é um limite a ser respeitado.
Para uma mente com traços narcisistas ou dominadores, isso é interpretado como um insulto pessoal.
Um estudo abrangente conduzido por Kjærvik e Bushman (2021), que analisou mais de 400 pesquisas, concluiu que há uma ligação direta e robusta entre narcisismo e agressão.
O motivo? O chamado “ego ameaçado”.
Quando a autoimagem de superioridade do indivíduo é desafiada — neste caso, pela recusa da mulher, que ele julga dever submissão — o cérebro não processa tristeza, mas fúria. A agressão física se torna a ferramenta para tentar “restaurar” essa superioridade perdida.
2. A Objetificação e a Desumanização da Parceira
O segundo fator é a objetificação. O discurso que Schutz propagava com frequência tratava relacionamentos como transações de mercado, reduzindo mulheres a “ativos” ou “passivos”.
Quando você tira a humanidade de alguém, vê-la como um objeto torna muito mais fácil agredi-la.
Pesquisas recentes, como a de Puente-Martínez et al. (2018), mostram que o chamado sexismo hostil — a crença de que mulheres manipulam ou tentam controlar homens — é um dos maiores preditores de violência doméstica.
Na mente do agressor, a recusa da parceira não é um direito dela, mas uma “quebra de contrato”.
A neurociência demonstra que essa crença desliga a empatia no cérebro. O córtex pré-frontal, responsável por frear impulsos violentos, é inibido por distorções cognitivas que fazem o agressor acreditar que tem o “direito” de punir a mulher.
3. A Escalada da Violência: Da Ameaça à Agressão Física
O caso de Schutz ilustra perfeitamente o processo de escalada da violência. Ele já respondia a processos por ameaça — o famoso caso do “processo ou bala”.
Muitos acreditam que ameaças verbais são apenas palavras, mas a ciência diz o contrário:
o comportamento violento raramente começa com um espancamento; começa com a intimidação.
Quando a intimidação verbal falha — ou seja, quando a vítima não se submete — o agressor sobe um degrau e parte para a violência física.
É o colapso do controle inibitório: aquele que pregava “controle emocional” na internet mostrou não ter nenhum na vida real. Ao ser contrariado, agiu movido pelo sistema límbico, a parte mais primitiva e impulsiva do cérebro.
4. O “Não” Como Desencadeador Para Egos Frágeis
O episódio do “Calvo do Campari” ensina uma verdade dura: discursos bonitos na internet não alteram a biologia do comportamento.
A agressão contra Laís Angeli Gamarra não foi um “acidente” ou um “momento de loucura”.
Foi o resultado previsível de uma mentalidade que não tolera frustração.
Para um ego frágil, o “não” é percebido como provocação, humilhação e ameaça — e não como um direito básico da outra pessoa.
Conclusão: Entender a Ciência é Proteger Vidas
Compreender a neurociência por trás desses comportamentos é vital para prevenção e educação.
Quem não respeita a palavra, fatalmente não respeitará o corpo.
A sociedade precisa aprender a reconhecer os sinais antes que eles evoluam para agressões físicas — porque, como a ciência mostra, o caminho é curto, previsível e trágico.



