O Instituto de Medicina Tropical da USP está à frente de um projeto inédito para preparar o Brasil contra doenças infecciosas com potencial epidêmico. Batizado de Prepare, o programa capacita o laboratório de Patologia da Faculdade de Medicina para realizar diagnósticos rápidos de vírus perigosos que ainda não circulam no país, como nipah, ebola, marburg, H5N1 e variantes do SARS-CoV.
Segundo o professor Amaro Nunes Duarte Neto, coordenador da iniciativa, o objetivo é antecipar-se a futuros surtos com protocolos prontos e insumos estocados, garantindo resposta rápida ao sistema de saúde. “A ideia é padronizar os diagnósticos antes que o evento ocorra. Esperamos que nunca aconteça, mas, se acontecer, estaremos preparados”, afirma.
Diagnóstico antecipado e tecnologia de ponta
O Prepare é inspirado na lista de patógenos prioritários da OMS e combina microscopia tradicional com técnicas imuno-histoquímicas avançadas. Isso permite não só detectar os agentes infecciosos, mas também entender como eles afetam os tecidos humanos, o que pode guiar estratégias de tratamento mais eficazes.
A experiência da pandemia de covid-19 revelou falhas estruturais, como a demora na importação de reagentes, biossegurança limitada e lentidão na confirmação dos primeiros casos. O projeto busca transformar essas dificuldades em prevenção, com protocolos prontos para uso imediato em caso de nova emergência sanitária.
Vírus nipah foi o primeiro foco
O trabalho inicial do Prepare foi voltado ao vírus nipah, patógeno de alta letalidade (70%) e endêmico no Sudeste Asiático. A doença causa encefalite grave e é considerada uma ameaça pandêmica global. Uma parceria com pesquisadores da Malásia possibilitou que a equipe brasileira acessasse amostras e padronizasse os métodos de diagnóstico, cujo resultado foi publicado em revista científica internacional.
A transmissão do vírus nipah ocorre por meio de uma cadeia incomum: morcegos frugívoros contaminam seiva de palmeiras, que é coletada por humanos e vendida como bebida tradicional. O professor Duarte Neto explica que se trata de uma zoonose, com episódios de spillover (transmissão do animal ao ser humano), o que torna a vigilância fundamental.
Monitoramento de novos vírus
Além do nipah, a equipe avança na padronização de testes para outros vírus da lista da Organização Mundial da Saúde, com atenção especial ao H5N1, subtipo da gripe aviária que já foi detectado em aves na América do Sul. A ameaça é real e crescente, o que fez com que o Prepare priorizasse esse patógeno nos seus cronogramas.
O projeto representa uma mudança na forma de atuação da saúde pública: em vez de reações após o surgimento de surtos, a proposta é preparar o país antes que eles aconteçam. Para o professor Duarte Neto, o investimento em infraestrutura e conhecimento científico é decisivo para que o Brasil esteja pronto para enfrentar novas epidemias ou pandemias, conhecidas ou inesperadas.
*Com a informação Jornal da USP



