Por Álvaro Nicotti*
Nunca tive tantos problemas com um carro como os que tive com meu Uno Mille Fire branco, 2006, adquirido no ano de 2022 para poder me deslocar de Imbé até Capão da Canoa, onde dava aula. Penei com esse carro até a finaleira de 2024. Um dos lugares preferidos dele era a mecânica — de preferência a do seu Jiló —, passando a sequência de quebra-molas na entrada da Nova Nordeste, em Imbé. Não é por menos: Jiló, além de mecânico, desmancha carros.
Pra se ter uma ideia, o Uno, num dos retornos noturnos de Capão, resolveu queimar os faróis na sua totalidade, ainda faltando bons quilômetros para chegar em casa. Chovia e ventava. Um pânico só. Mas não teve jeito. Não havia outra alternativa senão ir muito devagar, com a cabeça pra fora do carro, guiando-se pelo tracejado da estrada, até que um carro solidário se prontificasse a me guiar até onde as lamparinas da Paraguassú pudessem me salvar. Foi o que aconteceu, graças a todos os deuses e deusas.
Mas não para por aí. Ter um Uno branco 2006 nessas condições (confesso que fui facilmente enganado pelo proprietário anterior) não traz apenas transtornos dessa magnitude ao seu condutor, em termos de segurança. Um Uno branco, no estado em que ele foi comprado, pode levar seu proprietário a se separar da esposa, quando este precisa desligar o carro no meio da imensa fila do pedágio da Freeway por causa do superaquecimento do motor.
Uma confusão de brabeza com o carro e medo de fitar os olhos da mulher que, lá dentro dele, rosnava do banco do carona. O bom de tudo isso é que tu percebes que está cheio de gente com carro parecido com o teu. Muitos Unos, Gols quadrados e até Chevetes paravam solidários, no intuito de me ceder um garrafão de água para encher o radiador — o qual, por hora, eu não tinha no meu carro (o que intensificou ainda mais a brabeza da mulher).
Mas nem tudo é tristeza e dor. Podemos sempre aprender com nossos erros. Hoje posso dizer que meus conhecimentos de mecânica são de alto nível. Por estar toda hora consertando o carro por um motivo diferente, conheço dezenas de peças de veículos que, alguns anos atrás, não fazia a mínima ideia de que existiam. Isso me torna maduro, forte e seguro para que, com meu novo carro, eu entre de forma majestosa em qualquer mecânica quando ele precisar de algum retoque.
No entanto, antes de comprar meu novo carro — sim, evidente que tive que passar adiante meu Uno branco —, voltei às minhas origens e usei a bicicleta como meio de locomoção. Que beleza! Pedaladas à beira-mar, contemplação do pôr do sol ao passar pela ponte do rio Tramandaí e poder ir trabalhar sem gastar um tostão em gasolina — em 2023, passei a lecionar no IEE Barão de Tramandaí.
Mas tudo que é bom dura pouco. Pedalar na beira da praia e contemplar o pôr do sol é maravilhoso. Contudo, pedalar na neblina, com chuva farinando no rosto e um vento nordestão ciclonal não é tão bom assim. Confesso pra vocês que não sei dizer se é melhor pegar a ventania na ida do trajeto ou na volta. De repente na volta, né?
Só sei que esse esforço todo, quase que diário, pedalando contra o vento, me fez desenvolver uma hérnia inguinal — aquela que aparece na virilha. Que hérnia desgraçada! Incomodativa e inconveniente. Muitas consultas e exames até conseguir um diagnóstico preciso e marcar a cirurgia.
Hoje, aqui, escrevo no meu décimo quinto dia pós-cirurgia, que com certeza merece outra crônica. Mas a ideia aqui era dizer também que, nesse período de repouso e afastamento dos meus afazeres profissionais, pude ver uma porção de filmes interessantes, os quais fazia tempo que não via em sequência. Assim, compartilho aqui no TemQueVer uma lista bem legal para o pessoal ter opções de bons filmes para assistir.
Homem Irracional (2015, EUA)
Direção: Woody Allen
Elenco: Joaquin Phoenix, Emma Stone, Parker Posey
Sinopse: Abe, um professor de filosofia em crise existencial, encontra um novo propósito ao se envolver em um ato moralmente duvidoso. Um filme sobre o tédio, o acaso e as consequências de nossas decisões.
Perdi Meu Corpo (J’ai perdu mon corps, 2019, França)
Direção: Jérémy Clapin
Elenco: Hakim Faris, Victoire Du Bois, Patrick d’Assumçao
Sinopse: Uma mão decepada atravessa Paris em busca de seu corpo perdido. No caminho, ela revisita as memórias de amor e perda de seu dono. Uma animação poética e sensorial sobre desejo, destino e pertencimento.
Já Não Me Sinto em Casa Nesse Mundo (I Don’t Feel at Home in This World Anymore, 2017, EUA)
Direção: Macon Blair
Elenco: Melanie Lynskey, Elijah Wood, Jane Levy
Sinopse: Cansada da indiferença do mundo, Ruth decide fazer justiça com as próprias mãos após ter a casa assaltada. Ao lado de um vizinho excêntrico, embarca em uma jornada caótica e reveladora.
The Fundamentals of Caring (2016, EUA)
Direção: Rob Burnett
Elenco: Paul Rudd, Craig Roberts, Selena Gomez
Sinopse: Um cuidador e um jovem com distrofia muscular cruzam o país em uma viagem cheia de ironia, dor e humanidade. Um road movie sensível sobre amizade e recomeço.
6 Balões (6 Balloons, 2018, EUA)
Direção: Marja-Lewis Ryan
Elenco: Abbi Jacobson, Dave Franco, Tim Matheson
Sinopse: Em um único dia, Katie precisa lidar com a recaída do irmão viciado em heroína enquanto cuida de sua filha pequena. Um retrato duro e íntimo sobre amor familiar e esgotamento emocional.
O Conde (El Conde, 2023, Chile)
Direção: Pablo Larraín
Elenco: Jaime Vadell, Gloria Münchmeyer, Alfredo Castro, Paula Luchsinger
Sinopse: Pinochet é reimaginado como um vampiro cansado da imortalidade. Uma sátira política sombria, que mistura humor ácido, terror e crítica ao poder que se recusa a morrer.
Saudade Fez Morada Aqui Dentro (2023, Brasil)
Direção: Haroldo Borges
Elenco: Igor Santos, Thainá Duarte, Tânia Toko, Edmílson Barros
Sinopse: Bruno, um adolescente do interior da Bahia, enfrenta as dores da perda e o amadurecimento quando o pai desaparece. Um retrato delicado e poético sobre amor, luto e crescimento.
*Professor, pesquisador e editor do TemQueVer
**Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Porto Alegre 24 Horas