Fasc descumpre promessa de chamar concursados e seleciona entidade sem chamamento público

Fasc descumpre promessa de chamar concursados e seleciona entidade sem chamamento público

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Por: Gregório Mascarenhas / Sul 21 – O contingenciamento de gastos da Prefeitura teve, recentemente, consequências agudas em uma das áreas mais sensíveis dentre as atribuições do Executivo municipal: os órgãos que prestam serviços de proteção social básica nas regiões mais vulneráveis da cidade. Os Cras – Centros de Referência em Assistência Social – e os Creas – que oferecem serviços semelhantes ao dos Cras, mas com responsabilidades especializadas, para casos mais urgentes – estiveram em “iminência de fechamento” recentemente, por conta do fim do contrato, no começo de junho, com a organização que prestava o serviço. A Sociedade Meridional de Educação (Some), ligada à Congregação dos Irmãos Maristas, terceirizava o atendimento na cidade com 110 profissionais – ao mesmo tempo em que concursados aguardam nomeação para trabalhar na assistência social do município.

Após um hiato de quase três meses, entretanto, a Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc) diz ter firmado nova parceria com uma Organização da Sociedade Civil, com o objetivo de continuar atendendo os Programas PAIF e PAEF (Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos). É o que revela a edição de quarta-feira (16) do Diário Oficial de Porto Alegre: a Fasc publicou a decisão de parceirizar com a organização Instituto Pobres Servos da Divina Providência – e a “parceirização”, isto é, um tipo de terceirização dos serviços, se dá “com dispensa de chamamento público”, de acordo com o veículo governamental.

Instituto Pobres Servos da Divina Providência (IPSDP), ou simplesmente “Divina Providência”, é parte de uma congregação católica com o mesmo nome que tem como finalidade a atuação em assistência social, saúde, educação, esporte e lazer. A Fasc repassará ao Instituto o valor mensal de R$ 435.234,26, de acordo com a “proporcionalidade da equipe de referência disponibilizada”, e mais R$ 5.222.811,12 a cada 12 meses. A parceria tem validade de um ano, prorrogável por até cinco vezes, e a organização deve disponibilizar uma equipe de referência com 117 profissionais.


A urgência e a impossibilidade de a Fundação realizar o serviço são as justificativas para a dispensa de chamamento público; o Ministério Público chegou, inclusive, a solicitar que os serviços sejam reestabelecidos plenamente ainda neste mês. O IPSDP, de acordo com a Fasc, possui “notório conhecimento” e há uma lei que autoriza a dispensa para as atividades voltadas à assistência social.

“Os objetivos e as finalidades institucionais, bem como a capacidade técnica e operacional da organização são compatíveis e satisfatórios para parceirizar com o Poder Público para a exemplar execução dos serviços de PAIF e PAEFI, dispensando a realização de chamamento público”, argumenta o texto. O fato de o Divina Providência ser uma instituição sem fins lucrativos e atualmente possuir projetos de assistência social em Porto Alegre, diz a publicação, é outra razão para não haver abertura a outras entidades.

Enquanto isso, trabalhadores que passaram em um concurso no ano passado – em áreas como assistência social, educação e psicologia – aguardam chamamento por parte da Prefeitura, ao mesmo tempo em que o Executivo municipal age para suspender as nomeações. A justificativa, mais uma vez, passa por razões financeiras: “a Prefeitura de Porto Alegre alcançou, no mês de julho, o limite prudencial de gastos com pessoal. Essa informação, apesar das tentativas dos aprovados no concurso, demonstra que não é possível realizar o chamamento dos mesmos enquanto a situação financeira do município não for equilibrada”, respondeu a Fasc ao Sul21, em nota. Há, de acordo com a Fundação, um indeferimento do chamamento dos concursados por parte da Comissão de Despesas de Pessoal do município.

“Estamos à espera, e enquanto isso os centros seguem dessa forma. Tem Cras com apenas um funcionário que faz tudo. Em iminência de fechamento, pois não é possível atender com um funcionário. São vários nessa situação. E na medida que a Fasc não cumpre metas de atendimento às famílias, diminui o valor que recebe do Governo Federal”, denuncia a educadora Luciane Corrêa, em entrevista ao Sul21, logo antes da publicação da “parceirização”. Ela foi aprovada, em maio do ano passado, em um concurso cujo objetivo era atender determinações da Lei de Reordenamento de Nomeações da fundação.


A lei, aprovada ainda em 2014, previa a criação de 655 cargos efetivos na Fasc até 2021, para cumprir exigências estabelecidas pela Política Nacional de Assistência Social e a Norma Operacional Básica de Recursos Humanos. A Prefeitura, todavia, diz que não há imposição na normativa que diga que os serviços de assistência social sejam necessariamente executados por servidores efetivos.

A assistente social Deyse Eloy Cardoso, que também passou no concurso, conta que desde fevereiro os concursados vinham tentando diálogo com a gestão da Fasc. “Nessa tentativa, acordamos a questão de um cronograma de chamamento para fazer um programa de transição que seria o mais respeitoso e adequado para concursados e usuários e para os terceirizados, que seriam substituídos gradualmente. Em março, o presidente [Solimar Amaro, da Fasc] começou com algumas investidas no conselho municipal para poder fazer aditamento [isto é: complementação] do contrato da Some, que estava vencendo. Ficou nisso, e nosso cronograma foi ficando esquecido”, diz.

Luciane e Deyse fazem parte do coletivo Nomeações, já, que reúne os aprovados no concursos  de 2016. O grupo diz que na terceirização há vínculos de contratação frágeis e instáveis cujos impactos são vistos no cotidiano: “A Assistência Social hoje vive um momento dramático, de ofensivo desmonte. Isso é gravíssimo, pois é uma política de seguridade que tem impactos na proteção social de indivíduos e famílias”, afirmam.


Hoje, diz Luciane, as organizações terceirizadas prestam quase que a totalidade do serviço em Porto Alegre. “Não é ilegal que existam, mas ela deve ser algo a mais. Não podem tomar a frente como se fossem prestadoras do serviço público. Pouquíssimo é prestado em rede própria”, avalia. Ela afirma ainda que por conta da participação no coletivo, dificilmente conseguirão emprego nas organizações privadas. “Como a gente participa muito dos movimentos, todos eles já nos conhecem. Nós, do coletivo, certamente não conseguimos trabalhar em entidades”, lamenta.

“São entidades grandes e conhecidas, que fazem um domínio territorial dos serviços. Isso desmobiliza muito. O problema não são os trabalhadores terceirizados, são os processos, que fragilizam qualquer possibilidade de mobilização coletiva. Isso está acontecendo muito fortemente. São grandes entidades tomando conta de um serviço cujo carro chefe deveria ser público”, completa Deyse.

Há, por regra, cinco dias para recurso após publicação no Diário Oficial para contestação. O Instituto Pobres Servos da Divina Providência diz que só pode se manifestar após esse prazo.


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