Esta é uma daquelas grandes histórias de brasileiros anônimos que realizaram grandes façanhas num passado distante, mas não foram reconhecidos em vida. Assim aconteceu com Vicentina Gomes da Silva, uma jovem doméstica que trabalhava para uma família rica e sem esperar, realizou um grande feito: tornou-se a primeira mulher a pular de paraquedas no Brasil, há quase 100 anos atrás.
Vicentina morava em Glorinha, que na ocasião, era Distrito de Gravataí. Ela trabalhava na casa de um Tenente do Exército e certo dia foi junto com o patrão em um evento de acrobacias aéreas que o próprio Tenente havia organizado. No dia 14 de novembro de 1926, uma multidão comprou ingressos para assistir às apresentações aéreas que aconteceram na Várzea do Gravataí, em local que acredita-se ficar na região do Passo da Cavalhada. A estrela do evento seria uma paraquedista francesa, que rodava o mundo, encantando com seus saltos. Naquela época o paraquedismo era pouco praticado no Brasil e despertava muita curiosidade nas pessoas.
Mas naquele dia o destino resolveu escrever uma página diferente. Alegando riscos devido aos fortes ventos que sopravam naquela tarde nos céus da região, a francesa recusou-se a saltar. Isso não agradou a população, que começou a vaiar a organização do evento. Foi quando o Tenente resolveu fazer uma proposta para a jovem “doméstica”, de apenas 16 anos, talvez a mulher mais humilde ao seu alcance, naquele momento. v O dinheiro oferecido seria suficiente para comprar uma casa para sua família, que era muito pobre. Antes de saltar, com medo de não sobreviver, Vicentina mandou que o dinheiro fosse entregue à sua mãe, em caso de uma tragédia.
E assim o salto aconteceu. Logo após o salto, há 1000 metros de altura, fortes ventos jogaram a jovem moça para uma área de mata, distante do Campo da Aviação, tomada de maricás, uma espécie de vegetação espinhosa, nativa da região e que cobria grande parte da várzea local. Já quase em solo, o rudimentar paraquedas se abriu, jogando Vicentina sobre a vegetação, causando-lhe muitos arranhões. Embora o Correio da Manhã tenha escrito, anos depois, que ela se manteve calma antes e depois do salto, e que saltaria novamente se tivesse oportunidade, relatos dizem que ela jamais se aproximou de um avião novamente, e pior, nunca recebeu o valor prometido. As publicações antigas também contam que ela foi aplaudida pela multidão presente, que achavam se tratar da famosa estrangeira.
Ela viveu sua vida na região de Gravataí, vindo a falecer em 1971, sem ter sido reconhecida pelo seu feito. Ao longo de décadas, o título de mulher pioneira em saltos de paraquedas no Brasil pertenceu a uma paulista. Mas graças ao empenho de uma de suas netas, filha do caçula dos 9 filhos que ela deixou, que reuniu documentos históricos e conseguiu provar a façanha da avó. Hoje, Vicentina ocupa o seu devido lugar na história. A homenagem veio através de uma placa de reconhecimento que adorna sua sepultura desde 2005, no Cemitério Municipal de Cachoeirinha.
Voando no tempo para 98 anos depois do grande feito, um grupo de experientes paraquedistas, entre eles o gravataiense Hércules Perrone, respeitado Advogado da cidade, está organizando uma série de homenagens a quem se referem como uma verdadeira heroína. Como parte das festividades em comemoração aos 100 anos do grande feito, uma série de acrobacias aéreas será realizada neste sábado (07 de setembro), dependendo, mais uma vez, das condições climáticas e fará parte da programação da FEARG, Feira Agrorural e Turística de Gravataí. O Evento acontece no Parque de Eventos Valecy Cabeleira Bitelo, que fica localizado na Estrada Etamartamar Osmério Soares, 3870.
Reportagem Lelê Pereira – @reporterlelepereira